terça-feira, 30 de novembro de 2010

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A INCLUSÃO DA EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAL- AFRO BRASILEIRA NO CURRÍCULLO ESCOLAR E A FORMAÇÃO CONTINUADA


Maristela Mendes Pedroso1
SEDUC/CEFAPRO/TANGARÁ DA SERRA




O presente trabalho tem como objetivo abordar sobre a inclusão no Currículo Escolar da Educação Básica, a Educação das Relações Étnico Raciais para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, como Política Pública Educacional no Estado de Mato Grosso, na perspectiva da Lei. 10.639/03 e a formação continuada de professores pelo CEFAPRO- Pólo Tangará da Serra.

Palavras-chave: Educação, currículo e diversidade, Formação.

Segundo (SANTOS e MACHADO, 2007) uma das principais reivindicações apresentadas pelo movimento negro no âmbito da Subcomissão de negros, populações indígenas, pessoas deficientes e minorias, foi a educação, ou seja, a proposta de que o texto da Constituição Federal de 1988 afirmasse o compromisso da educação com o combate ao racismo e todas as formas de discriminação, com a valorização e respeito à diversidade assegurando a obrigatoriedade do ensino de história das populações negras do Brasil, como uma das condições para o resgate de uma identidade étnico-racial e a construção de uma sociedade plurirracial e pluricultural.
Essas propostas foram inicialmente aceitas na Assembléia Nacional Constituinte e inseridas no anteprojeto (BRASIL, 1987b) elaborado e aprovado nessa Subcomissão:
Art. 5º O ensino de "História das Populações Negras do Brasil" será obrigatório em todos os níveis da educação brasileira, na forma que a lei dispuser.

Ao ser submetido à Comissão Temática da Ordem Social (BRASIL, 1987a), sofre alteração. Art. 85 O poder público reformulará, em todos os níveis, o ensino de história do Brasil, com o objetivo de contemplar com igualdade a contribuição das diferentes etnias para a formação multicultural e pluriétnica do povo brasileiro.
Por fim, aprovado na Comissão de Sistematização (BRASIL, 1987b). Art. 242 - O ensino de história do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e étnicas para a formação do povo brasileiro.
A justificativa apresentada para a retirada dessa proposta do texto constitucional foi a de que, por se tratar de uma questão muito particular, deveria ser abordada em legislação complementar específica.
Vimos que,  mesmo a Constituição de 1988, considerada como um marco na história da inclusão social, não contemplava em seus artigos as reivindicações dos movimentos, aqui nesse caso o movimento Negro. Somente 15 anos depois o movimento viu suas reivindicações se concretizarem, com a Lei 10.639/03, a qual alterou o Artigo 26 e o Artigo 79 da Lei 9394/96(LDBEN). O Artigo 26 A foi  novamente alterado em 2008 pela Lei 11.645/08, com o objetivo de acrescentar sobre a questão indígena, Cuja redação ficou dessa forma;
Art. 26-A.  Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
§ 1o  O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
§ 2o  Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileira. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
Ressaltamos que a Lei 10.639/03, não foi substituída pela Lei 11.645/08, mas sim sofreu um acréscimo para contemplar as questões indígenas, vejamos, o Artigo 79-B, não aparece na Lei 11.645/08, mas continua válido na Lei 9394/96 conforme redação: Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’.(Incluído pela Lei nº 10.639, de 9.1.2003).
O Conselho Nacional através do parecer 003/2004/CNE/CP, regulamenta as alterações na Lei 9394/96(Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), pela Lei 10.939/03. Em Mato Grosso, o Conselho Estadual de Educação também regulamenta e orienta a sobre a implementação da Lei 10.639/03.

Este Parecer tem como objetivo orientar o Sistema de Ensino, bem como, os Órgãos e Instituições que os integram, para o cumprimento da Lei Nº. 10.639/03, que altera a Lei Nº. 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB, estabelecendo a obrigatoriedade do Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, na Educação Básica, regulamentada pelo Parecer CNE/CP Nº. 03/04, de 10/03/04, cumprindo ao estabelecido na Constituição Federal Artigos: 5, Inciso I, 206, Inciso I, 210, 215, 216 e §1 º do Art.242, a Lei Estadual Nº. 7.775 de 26 de novembro de 2.002, que dispõe sobre o Programa de Resgate Histórico e Valorização das Comunidades Remanescentes de Quilombos de Mato Grosso, Lei Nº 8069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente e Plano Nacional de Educação, Lei nº. 10.172 de 09 de janeiro de 2001. (Parecer n.236/2006/CEE/MT)
Com objetivo de implementar a Lei 10.639/03 e a Lei 11.645/08, a Secretaria de Estado de Educação-SEDUC, vem realizando ações, tais como orientações em Portarias que orientam o Ano Letivo, cursos, em 2009 cria nos CEFAPROS a cadeira de Professores Formadores na Área da Diversidade, nas temáticas: Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos, Diversidade na Educação Básica, Educação Escolar indígena e educação Quilombola.Estes profissionais tem como responsabilidade orientar as escolas e fazer a formação continuada dos professores nestas temáticas
Coube as escolas através do currículo,  cumprir a execução da Lei 10.639/03 e  Lei 11.645/08. Em 2009 a Secretaria lançou em versão preliminar - As Orientações Curriculares para a Educação Básica de Mato Grosso - com objetivo de orientar as escolas na construção do Currículo escolar na Temática da Educação para as Relações Étnico-raciais como proposta de fortalecer e valorizar as relações étnico-raciais;

As Políticas de Educação para as questões étnico-raciais tratam da valorização da diversidade, visando compatibilizar os conteúdos da educação com as especificidades das diversidades étnicas, raciais e culturais, na perspectiva de realizar a inclusão e a redução das desigualdades. A discriminação racial e étnica no Brasil se reproduz em vários contextos sociais das relações entre negros e não-negros, bem como entre indígenas e não-indígenas, ou entre nacionais e imigrantes. A escola não se encontra isenta dessa reprodução. Embora ela não seja produtora dessas relações, acaba por refletir as tramas sociais existentes no macro-espaço social, muitas vezes reforçando o racismo e a discriminação. (Orientações Curriculares, 22/08/2009).
           
Diante das legislações vigentes a escola começa a por em prática as orientações e/ou obrigações a ela imposta pelas políticas educacionais. Não podemos esquecer que esta mesma escola que hoje tem como obrigação/objetivo a inclusão das diversas diversidades é a mesma que culturalmente e historicamente a excluiu, pois tinha como um de seus diversos papéis o nivelamento da “igualdade” sem reconhecer a diversidade. Não podemos desconsiderar também que a mesma escola mesmo timidamente já trabalhava estas questões por profissionais militantes em diversos movimentos sociais.
E principalmente não podemos desconsiderar que por séculos e não anos esta mesma escola tem trabalhado com material didático, aqui ressaltando os livros didáticos que sempre trouxeram o negro para dentro da sala de aula como um ser desvalorizado, escravizado, brigão, fujão, onde capatazes os caçavam como animais. Textos e figuras lidos e mostrados sem nenhuma crítica em relação ao escravismo. Omitindo e/ ou apresentando de forma simplificada e falsificada o cotidiano dos escravos. A sua presença nesses livros foi marcada pela estereotipia e caricatura, Os livros continuam contemplando a questão africana como menor. Eles contemplam personagens jogadores de futebol, cantores de pagodes e desportistas. As  personalidades negras não se restringem somente a jogadores,há também ministros, escritores e outras personalidades negras, que não são colocadas em destaques.

Geralmente, quando personagens negros entram nas histórias aparecem vinculados à escravidão. As abordagens naturalizam o sofrimento e reforçam a associação da cor...... Cristalizar a imagem do estado de escravo torna-se uma das formas mais eficazes de violência simbólica........O problema não está em contar histórias de escravos, mas na abordagem do tema.(LIMA,2005)

Escola que reproduz a sociedade, sociedade que tem no seu imaginário o Mito da Democracia Racial, que impregnada desse  imaginário nacional prega a igualdade racial sem respeitar as diversidades existentes neste contexto nacional. E é esta mesma escola que precisa reverter esta educação e a visão social destes alunos que a freqüentam.
Diante deste contexto está o professor que através de ações que muitas vezes pontuais procuram cumprir as modificações propostas nos currículos escolares.
Mas encontramos também depoimentos de que não conseguem fazer o melhor por não haver material didático específico, que mesmos os livros didáticos atuais não ajudam, pois não trazem a inclusão da temática de forma interdisciplinar, ainda não encontramos, por exemplo, textos sobre a história de lutas dos negros no contexto da história da escravidão. Saem de um Curso de Graduação sem ter trabalhado mais a fundo sobre a temática da Diversidade Étnico-Racial.
Não podemos simplesmente fazer um questionamento de qual é a atitude da escola quanto a inclusão da História Afro-Brasileira no Currículo Escolar. O que precisamos é questionar qual é o conhecimento destes educadores para aprofundar as discussões e o ensino da História Afro-Brasileira e África e ainda trabalhar na desconstrução do preconceito racial. Quais as dúvidas e equívocos que há quando essa temática é tratada?
Embora façam sete anos da Lei 10.639/03, a discussão  nas escolas e em cursos para professores é nova e deverá precisar de muitas discussões para que possamos conseguir que essa temática seja incluída de fato nos currículos escolares e deixem de ser tratada de forma pontual.
Em encontros realizados com professores com objetivo de orientar sobre a inclusão da temática no Currículo, percebemos e ouvimos depoimentos de professores sobre as dificuldades encontradas em trabalhar a temática. Ou outros que tem projetos muitos bons, mas são trabalhados de forma pontual, no 13 de Maio e/ou  no  Dia Nacional da Consciência Negra’.
Em  recente pesquisa, por ocasião do curso², com 194 professores de  16 escolas, foi solicitado aos professores que observassem em suas respectivas escolas  sobre as relações preconceituosas.Ao apresentarem o resultado das observações a maioria destes professores apresentaram uma escola sem preconceito. Notamos a invisibilidade das relações étnicas raciais e diversidade nos relatos apresentados. Isso nos leva crer que as instituições estaduais, municipais e as academias necessitam promover cursos e discussões  específicas  nessa temática que alcance o professor em sala de aula, com objetivo de tornar visível as relações étnicas raciais, pois como GOMES diz,

O mais sério é que, dada a invisibilidade da questão racial na escola, muitas vezes educadores  e  educadoras, ao adotarem tais práticas, sequer percebem que essas salas são formadas por uma grande parcela de alunos negros e pobres. (GOMES, 2002)

Um dos desafios do CEFAPRO de Tangará da Serra e o de trabalhar de forma efetiva a formação continuada do professores com o objetivo de subsidiá-los  com conhecimentos sobre a inclusão da Diversidade Étnica Racial Afro – brasileira no currículo escolar e sensibilizar o professor que atua na sala de aula, da importância desta temática nas relações étnicas raciais e  sociais, e que, tornou-se evidente, que as relações de desigualdade, preconceito e racismo não estão restritas nas relações sociais fora da escola. A escola é um espaço importante para se trabalhar na perspectiva de incorporar no currículo estratégias para a desconstrução da construção social do preconceito étnico-racial sem negar as diferenças, mas respeitando o diferente em seus direitos, no contexto de país que segundo o IBGE, em 2000 cerca de 76 milhões de pessoas (cerca de 44%) se assumem oficialmente como “pretas” e “pardas”.


Notas


1 Licenciada e Bacharel em História – UFMT, Especialista em Ed. Escolar Indígena UNEMAT, Especializando em Relações Raciais e Educação na Sociedade Brasileira –UFMT/NEPRE, professora formadora do CEFAPRO-Tangará da Serra em Educação Quilombola e Div. Étnico Racial Afro-brasileira.

² Curso:Educação, Identidade e Diversidade- CEFAPRO Pólo de Tangará da Serra -2009.





Bibliografia

BARROS, José D’Assunção. A Construção Social da Cor: diferença e desigualdade na formação da sociedade brasileira. Petrópolis, RJ. Vozes, 2009.
BRASIL. Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 23 dez. 1996. Disponível em: http://www.mj.gov.br/conade2.htm.
BRASIL. Lei nº. 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e cultura afro-brasileira", e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/2003/L10.639.htm
GOMES, Nilma Lino. Educação e identidade negra. In Aletria – revista de estudos de literatura. Alteridade em questão. Belo Horizonte, POSLIT/CEL, Faculdade de Letras da UFMG, v6, 9, dez/2002.p.38-47
MATO GROSSO, Orientações Curriculares para a Educação Básica do Estado de Mato Grosso, SEDUC, 2008/2009.
MATO GROSSO, Parecer N.234/2006. Aprovado em: 05/09/2006.
MUNANGA, Kabengele. (Org.). Superando o Racismo na Escola. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. Brasília – DF.
SANTOS, Sônia Querinos dos. MACHADO.Vera Lúcia de Carvalho. Políticas públicas educacionais: antigas reivindicações, conquistas (Lei 10.639) e novos desafios. Revista Brasileira de Educação, 2007.